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Índia supera China em população e vive boom econômico marcado por desigualdade e risco à democracia

Nova Délhi quer oferecer algo como uma terceira via em um mundo conturbado e a caminho do que muitos enxergam como uma nova Guerra Fria

Tráfego na cidade velha de Nova Délhi (Mauricio Lima/The New York Times)

Em algum momento na sexta-feira, segundo projeções da ONU, a Índia atingirá a marca de 1.425.775.850 habitantes. O número, uma estimativa a partir de padrões de crescimento demográfico, é significativo e transforma o país do Sul da Ásia no mais populoso do planeta, superando a China. Uma série de outras projeções, de órgãos como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, considera também que o novo recorde demográfico acompanha uma mudança profunda que se desenha para as próximas décadas: a ascensão de uma potência de peso econômico crescente e em busca de seu lugar no mundo. À sombra da disputa entre Washington e Pequim, a Índia já vem buscando posicionar-se como um terceiro ator global. O contexto internacional parece propício: Nova Délhi quer oferecer algo como uma terceira via em um mundo conturbado e a caminho do que muitos enxergam como uma nova Guerra Fria. Entre outras coisas, servirá em 2023 como presidente do G20, o fórum no qual as principais economias do planeta se reúnem; e tem a vontade declarada do governo de aproveitar a oportunidade para ditar o ritmo e influenciar questões internacionais. A 5ª maior economia Narendra Modi, o primeiro-ministro nacionalista do país, deu o tom desse projeto geopolítico no ano passado, quando o produto interno bruto (PIB) da ex-colônia britânica superou o do Reino Unido e ela se tornou a quinta maior economia do mundo: — Deixamos para trás aqueles que nos governaram por 250 anos — afirmou. — Não vamos parar agora. As expectativas são altas. Em um ano marcado pelo pessimismo e com as economias rachadas por turbulências de todos os tipos, “a Índia continua sendo um ponto positivo”, disse Pierre-Olivier Gourinchas, diretor de análise do FMI, apresentando o relatório Perspectivas Econômicas para 2023. Ao lado da China, a Índia será a locomotiva do planeta este ano: juntas contribuirão com 50% do crescimento mundial. Grandes corporações, como a Apple, começaram a transferir parte de sua produção para o país. O Banco Nacional da Índia acredita que a nação sul-asiática se tornará a terceira maior economia do planeta em 2029. — Muitos já disseram que é a década da Índia. Sinceramente, acho que é o século da Índia — disse Bob Sternfels, CEO da consultoria McKinsey em entrevista no ano passado. Entre seus argumentos, ele usou a população: o país, disse ele, está a caminho de se tornar um polo industrial e até 2047 a expectativa é de que 20% dos trabalhadores do mundo sejam indianos. Alguns analistas indianos consideram que, de fato, chegou o momento do salto.

Narendra Modi, primeiro-ministro da Índia. — Foto: Money Sharma / AFP

— Enquanto a China já enfrenta uma crise demográfica, a Índia está colhendo um dividendo demográfico — diz Brahma Chellaney, professor de Estudos Estratégicos do Centro de Pesquisa Política, com sede em Nova Délhi. A idade média, diz ele, é de cerca de 28 anos, o que torna o país um dos mais jovens do mundo — nos EUA, a média é de 38 anos, e na China, de 39. E esta população “está conduzindo um rápido crescimento econômico, contribuindo para o auge do consumo e impulsionando a inovação, evidenciada pelo desenvolvimento de uma economia da informação de nível mundial”, avalia. O processo já dura algum tempo. Em seu livro “As novas Rotas da Seda”, o historiador Peter Frankopan apontou que “a expansão espetacular da classe média indiana nas últimas três décadas continua hoje em um ritmo extraordinário. Embora alguns economistas apontem que a distribuição de riqueza na Índia é altamente desigual e são os ricos que se beneficiam desproporcionalmente, é revelador o fato de que o número de famílias com uma renda disponível de mais de US$ 10 mil por ano aumentou em dois milhões em 1990 para 50 milhões em 2014”. Esses dados já são antigos, mas seguem significativos. Há outros mais atuais: o gasto do consumidor final mais que dobrou na Índia desde 2010, chegando a US$ 2,25 trilhões em 2021, segundo o Banco Mundial. Chellaney aponta que o desafio é “aproveitar ao máximo” custos trabalhistas relativamente baixos e o crescente interesse das empresas ocidentais em transferir a produção da China para se tornar “uma potência industrial”. Esse interesse cresceu durante a pandemia frente à política de Covid zero adotada pela China, que manteve suas fronteiras externas praticamente fechadas por três anos. Também se somam os atritos com os EUA e o receio de um conflito em Taiwan. — As empresas não estão saindo do gigante asiático, mas estão se diversificando: o investimento que poderia ir para a China está indo para outros lugares — diz Bettina Schoen-Behanzin, vice-presidente da Câmara de Comércio da União Europeia na China. Oportunidade geopolítica A porta que se abriu para a Índia não é apenas econômica, mas também geopolítica. O país está tentando se posicionar “como uma ponte entre potências rivais”, avalia Chellaney. Nova Délhi, por exemplo, tem uma aliança histórica com a Rússia e faz parte da Organização de Cooperação de Xangai. Nesse órgão regional asiático, convive, além da Rússia, com a China, com a qual mantém um conflito fronteiriço ainda aceso, e o Paquistão, com que tem um longo histórico de hostilidade. Por outro lado, a Índia tem fortalecido os laços com o Ocidente e seus aliados, participando do fórum de segurança Quad, focado no Indo-Pacífico, e do qual fazem parte também EUA, Austrália e Japão. Para Washington, a Índia — uma potência nuclear — tornou-se peça cada vez mais importante para fazer frente ao crescente poderio da China. — Acho que os formuladores de políticas indianas reconhecem que este é um momento que eles não podem perder — analisa Harsh Pant, vice-presidente de política externa e estudos da Fundação de Pesquisa do Observador, com sede em Nova Délhi, que dá como exemplo a ambiciosa política de comércio exterior lançada na semana passada com a meta de atingir os US$ 2 trilhões de exportações em 2030, o que significaria quase triplicar o valor atual. (O Globo)

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