
José “Pepe” Mujica morre aos 89 anos
José “Pepe” Mujica, ex-presidente do Uruguai, morreu nesta terça-feira (13), aos 89 anos. A notícia chega meses após ele anunciar, em abril de 2024, que enfrentava um câncer no estômago. Na ocasião, ele explicou que a gravidade do quadro era “duplamente complexa”, já que convivia há mais de 20 anos com uma doença imunológica que comprometia seus rins. Esse fator dificultava qualquer possibilidade de quimioterapia ou cirurgia.
Despedida em vida
Em outubro do mesmo ano, Mujica participou de um evento público com tom de despedida. Foi sua primeira aparição desde que deixou o hospital em agosto. Embora sua médica tenha declarado forte convicção na cura do câncer, ressaltou que sua condição geral ainda era frágil. Durante o discurso, Mujica afirmou estar “perto de se retirar para o lugar de onde não se volta”, emocionando o público.
Juventude e militância revolucionária
Mujica nasceu em 20 de maio de 1935, em Montevidéu. Na década de 1960, ele se uniu ao Movimento de Libertação Nacional – Tupamaros, grupo guerrilheiro de esquerda. Antes mesmo da ditadura militar se instalar, em 1973, o grupo já realizava ações como assaltos a bancos e distribuição de alimentos e dinheiro entre os pobres.
Durante os anos de militância, Mujica se envolveu em intensos confrontos com a polícia. Acabou ferido quatro vezes e fugiu da prisão duas vezes. No entanto, foi recapturado definitivamente em 1972.
Prisão e resistência
Ao longo da ditadura uruguaia, Mujica passou 14 anos na prisão. Durante esse período, sofreu torturas físicas e psicológicas. Ficou isolado por longos períodos em celas solitárias. O regime militar o classificou como preso “sequestrado”, ou seja, poderia ser executado caso os Tupamaros retomassem a luta armada.
Com a redemocratização do país, em 1985, Mujica recuperou a liberdade graças a um decreto de anistia. A partir desse momento, ele decidiu ingressar na política formal e institucional.
Transição para a política partidária
Logo após sua libertação, Mujica ajudou a fundar o Movimento de Participação Popular (MPP), partido de esquerda que passou a integrar a coalizão Frente Ampla. Em 1994, ele se elegeu deputado e, cinco anos depois, conquistou uma vaga no Senado. Com a eleição de Tabaré Vázquez em 2005, o novo presidente o nomeou ministro da Agricultura.
Presidência e reformas sociais
Mujica assumiu a presidência do Uruguai em 2010, sucedendo Vázquez. Seu mandato, que terminou em 2015, foi marcado por políticas voltadas à inclusão social. O percentual de gastos públicos direcionado à área social saltou de 60,9% para 75,5%. Além disso, o salário mínimo teve um aumento expressivo de 250%.
Em 2012, ele propôs a legalização da maconha. A medida avançou no Congresso e acabou implementada, tornando o Uruguai pioneiro na regulação estatal da droga. Dessa forma, consolidou uma política pública inovadora em nível global.
Simplicidade como marca pessoal
Mesmo no cargo mais alto do país, Mujica escolheu viver com simplicidade. Morava em uma pequena chácara nos arredores de Montevidéu com sua esposa, Lucía Topolansky. Todos os dias, dirigia seu velho Fusca 1987 até a sede do governo, na Praça Independência.
Por outro lado, ele também ficou conhecido por doar cerca de 90% do salário presidencial para instituições que atuavam no combate à pobreza.
Últimos anos e legado
Após deixar a presidência, Mujica voltou ao Senado, onde atuou até 2020. Naquele ano, ele renunciou por razões de saúde, em meio à pandemia de Covid-19.
Nos anos seguintes, dedicou-se ao cultivo de sua horta e à reflexão sobre temas sociais e políticos. Mesmo sem seguir uma religião, demonstrava uma espiritualidade ligada à natureza. Em 2012, afirmou: “Não tenho religião, mas sou quase panteísta: admiro a natureza”.
Com isso, o ex-presidente encerra uma vida marcada por coerência entre discurso e prática. Sua trajetória combina luta política, resistência, e compromisso com a simplicidade e a justiça social.